ESPAÇO DE ENCONTRO E REFLEXÃO ENTRE CRISTÃOS HOMOSSEXUAIS em blog desde 03-06-2007
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publicado por Riacho, em 26.03.09 às 20:57link do post | favorito

26/3/2009
 
Cardeal de Nova York pede o fim do celibato
 

Faltando poucos dias para se aposentar, o  cardeal e arcebispo da Arquidiocese de Nova York até o próximo dia 15 de abril, Edward Egan, disse que a Igreja católica deveria rever o fim do celibato e permitir o casamento dos sacerdotes. “É uma discussão perfeitamente legítima”, afirmou o cardeal em Albany, a capital de Nova York, durante uma entrevista a uma emissora de rádio, a Talk 1300.

A informação é do boletim eletrônico Religión Digital, 23-03-2009. A tradução é do Cepat.

“Penso que é preciso considerar esse assunto”, disse Egan ao locutor Fred Dicker.

“Não estou certo se não seria uma boa ideia tomar uma determinação [se os sacerdotes podem se casar] que não faça uma passagem de fronteira com base na cultura e na geografia”, continuou.

“Há muitas Igrejas orientais, católicas, católicas romanas, nas quais se permite o casamento sem nenhum problema”, acrescentou o Cardeal.

Na entrevista de 10 de março disse ainda que não era uma sugestão para o seu sucessor, o arcebispo de Milwaukee, Timothy Dolan.

A Igreja católica se opôs durante séculos ao casamento dos sacerdotes e os últimos três Papas se recusaram a falar sobre o assunto.

A controvérsia cresceu nos Estados Unidos. Em 2003, cerca de 200 sacerdotes da Arquidiocese de Milwaukee pediram à Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos para que considere a ideia, já que o número de sacerdotes estava diminuindo. A ideia foi rechaçada por Dolan.

Para ler mais:

in: http://www.unisinos.br/_ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=20844


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publicado por Riacho, em 25.03.09 às 23:15link do post | favorito

Olá


Aqui fica uma sugestão de cinema: Shelter


Forçado a desistir do sonho de entrar para uma prestigiada escola de arte, a fim de cuidar da sua família, Zach (Trevor Wright) habitua-se a uma vida onde omite as suas próprias necessidades em favor de cuidar de sua irmã mais velha, Jeanne (Tina Holmes) e o seu sobrinho, Cody que o considera um verdadeiro pai. Quando o irmão mais velho do seu melhor amigo, Shaun (Brad Rowe), regressa a casa para procurar inspiração para um novo livro, Shaun e Zach acabam por desenvolver uma grande amizade. Apesar de namorar com a jovem Tori (Katie Walder). Zach aos poucos deixa-se relacionar emocionalmente com o escritor que não esconde o facto de gostar muito dele. E apesar de sentir-se atraído por Shaun, Zach vai estar cheio de dúvidas e terá receios de enfrentar a sua verdadeira identidade, a sua família e amigos. Quando finalmente o jovem assume os seus sentimentos, eis que irá surgir outro dilema na sua vida deixando-lhe a pensar naquilo que é mais importante para si, se o amor e os estudos ou se a sua família.








Trailer do filme:
 

 


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publicado por Riacho, em 25.03.09 às 21:26link do post | favorito

 

25/3/2009
 
''A origem das espécies''. Gênesis 1 e a vocação científica do homem
 

Reproduzimos na sequência um extrato do ensaio, publicado no número 3807 da revistaLa Civiltà Cattolica, com a data de 07 de fevereiro de 2009 (veja a notícia anterior). O autor do artigo é Jean-Pierre Sonnet, jesuíta, professor da Pontifícia Universidade Gregoriana, Roma.

“A origem das espécies”. Gênesis 1 e a vocação científica do homem, porJean-Pierre Sonnet

Quando se fala das origens, para os cristãos de nosso tempo o desafio é o de viver uma dupla cidadania: uma fidelidade inteligente ao ensino de Gênesis 1 e uma abertura atenta às propostas da pesquisa científica. [...] Contudo, hoje eles devem afinar essa dupla lealdade, num tempo em que alguns se divertem jogando as noções da criação uma contra a outra, sob a forma de ideologias – criacionismo e evolucionismo – reciprocamente excludentes.

Para os defensores do evolucionismo, voltar ao poema inicial do Gênesis significa uma regressão a uma forma de obscurantismo incompatível com a racionalidade da idade moderna. Neste ensaio buscaremos demonstrar que a referência aos primeiros capítulos do Gênesis não implica em absoluto uma renúncia da inteligência. [...] Uma racionalidade luminosa atravessa estes textos, capazes de falar a cada homem razoável, e em particular ao homem de ciência contemporâneo. [...]

* * *

Gênesis 1 poderia ter como subtítulo “Process and Reality”: o ato criador foi distribuído em momentos sucessivos, na sequência de uma semana. [...] Longe de ser uma explosão de potência cega, a criação – segundo o poema narrativo de Gênesis 1 – é uma ação que se desenvolve progressivamente, numa sequência ordenada, na qual se enuncia um desenho.

A progressão – como mostrou Paul Beauchamp no ensaio “Création et séparation” – é acima de tudo a de sucessivas separações, expressas desde o início com a raiz verbal “badal”: “E Deus separou a luz das trevas” (1, 4; cf. também 1, 6.7.14.18). A partir do terceiro dia, uma vez constituídos os macro-elementos do cosmos, não aparece mais o verbo da separação (exceto em 1, 14.18, a propósito dos “grandes luzeiros”), substituído por outra expressão: “segundo a própria espécie”. Tal fórmula, repetida dez vezes, se refere primeiro às espécies vegetais (1, 11-12) e depois aos animais (1, 21.24-25). Desde a origem, Deus salva do informe e do indeterminado, constituindo progressivamente um mundo diferenciado.

Em sua sequência, os dias da criação amplificam a sucessão já ligada à palavra. Desde o primeiro dia os atos divinos, por quanto imediatos, se manifestam de modo discursivo. [...] A sucessão é sem dúvida uma lei da linguagem e, em particular, do discurso narrativo, que pode dizer as coisas somente uma depois da outra. Num reflexo de “realismo” teológico, o relato de Gênesis 1 se preocupa em fazer remontar essa sucessão à própria liberdade divina. [...]

Seguindo passo a passo as iniciativas divinas, o narrador se preocupa em acentuar o que o desígnio divino tem construído e finalizado. O ato criador, em sua sequência, não é um processo aleatório ou uma extravagante dispersão de energia. O gesto divino – afirma o narrador – se desdobra entre “princípio” (1, 1) e “cumprimento” (ver o verbo “concluir’ em 2, 1), e numa série (“primeiro dia”, “segundo dia”, etc.) que aparece progressivamente completada, a dos seis dias mais um. Enfim, no final do relato descobrimos que Deus conclui precisamente o que havia começado a criar na origem, “o céu e a terra” (2, 1; cf. 1, 1). Em outros termos, o processo se insere na inteligência de um plano que preside cada um de seus movimentos.

Paradoxalmente, o domínio divino no Gênesis 1 tem sua mais bela demonstração nas pausas que dão ritmo à sequência criadora. De fato, Deus une às suas iniciativas criadoras um sinal de pausa e de maravilha: “Deus vê que a luz era coisa boa” (1, 4). [...] Em cada uma destas pausas Deus revela que não é em hipótese alguma escravo de sua própria força; pelo contrário, esta é a máxima experiência de sua liberdade, como se descobre no sétimo dia, quando Deus “cessou de todo o trabalho” (“wayysbot”, da raiz “sabat”) e consagra um dia inteiro a esta pausa (2, 2). Em vez de ocupar o sétimo dia da série para “esgotar” a própria potência criadora e encher todo o mundo, o Deus bíblico põe um limite ao gesto criador, “dominando seu domínio”, para dizê-lo com Salomão: “Tu, Dono de tua força, julgas com moderação e nos julgas com muita indulgência” (Sb 12, 18). Nesta pausa Deus fixa sua recusa em encher tudo e, correlativamente, sua vontade de abrir um espaço de autonomia ao universo, em particular à humanidade. [...]

Por fim, este processo – com sua disposição – revela a finalidade que lhe subjaz: os elementos progressivamente constituídos desenham uma curva, que vai do “bom” do versículo 4 ao “muito bom” do versículo 31. O eixo da palavra é o que melhor revela tal curva do espaço criado. Se desde a criação da luz Deus fala, e se fala de todos os elementos que cria – “Haja luz... Acumulem-se as águas... Haja luzeiros no firmamento...” –, Ele fala em segunda pessoa somente aos seres vivos, a partir do quinto dia: “Sede fecundos e multiplicai-vos, e enchei as águas dos mares, e as aves cresçam na terra”. Até então as criaturas não eram interpeladas, mas, no máximo, eram destinatárias de ordens em terceira pessoa. A partir deste momento Deus fala a criaturas vivas, capazes de entendê-lo.

Mas é no sexto dia, com a criação do homem, que a pessoa gramatical faltante – a primeira pessoa – faz seu aparecimento na boca de Deus. Primeira pessoa do plural: “Façamos o homem” (versículo 26), e depois no singular: “Eu vos dou toda planta como vosso alimento” (v. 29). E é com o aparecimento do casal humano que a palavra divina se dá um interlocutor explícito: “Deus lhes disse” (v. 28). Deus se dirige – e na primeira pessoa – ao ser que será também o ser de linguagem, “o ser à imagem”, destinado ao domínio brando da palavra.

A sequência era, pois, em cada uma de suas partes, ordenada ao próprio fim. E a forma narrativa, em particular em seu modo de representar as variações na palavra divina, tem sido o veículo eficaz de tal fim.

* * *

Gênesis 1 poderia ter como subtítulo “A origem das espécies”, dado a vinculação do plano divino com a diversidade de espécies. Certamente, aqui não se trata do processo de evolução das espécies. Se Gênesis 1 evoca um processo, este deve ser buscado na sequência dos dias, ao longo dos quais Deus faz surgir as espécies vegetais, as espécies animais da água e do ar e as da terra firme. Os diversos biótipos são respeitados (água, firmamento, terra), mas a participação divina não se dirige a “classes” de animais, mas vai diretamente às espécies particulares: os vegetais e os animais aparecem todos “segundo a própria espécie” (vv. 11-12, 21.24-25). E estas espécies aparecem “tais quais”, ou seja, no estado em que o olhar do homem as encontra desde o v. 28. A flora e a fauna consagradas por Deus na bondade que lhes é própria são as que acompanham a família humana em seu destino. [...]

Se as espécies são levadas cada uma à existência com uma intervenção imediata de Deus, são também criadas com autonomia própria. As espécies vegetais surgem providas de seu princípio de reprodução: “Produza a terra vegetação: ervas que dão sementes, e árvores frutíferas que, segundo a sua espécie, produzam frutos contendo em si a sua semente” (1, 11). Em relação aos representantes das espécies animais, lhes disseram: “Sede fecundos e multiplicai-vos” (1, 22). Se a heteronomia está presente em cada instante do poema narrativo de Gênesis 1 – e já que as criaturas têm seu segredo neste Outro que as faz surgir –, a autonomia das espécies na duração também é manifesta: Deus cria os seres vivos confiando-lhes a sua autonomia reprodutiva, o que os fará “iguais” de geração em geração.

Há um outro texto do Pentateuco, o capítulo 11 do Levítico, em que se torna plenamente evidente o argumento do “discurso sobre as espécies” de Gênesis 1. [...] O tratado sobre os animais puros e impuros que se lê no Levítico 11 constitui, com efeito, uma posta em ato sofisticada dos dados e das distinções introduzidas no Gênesis 1. Uma nova luz foi trazida sobre Levítico 11 com os trabalhos de Mary Douglas, antropóloga inglesa, que publicou, em 1966, Pureza e Perigo [Lisboa: Edições 70, 1991]. Já em 1962, Claude Lévi-Strauss em seu O Pensamento Selvagem [8. ed. Campinas, SP: Papirus, 2007] havia [...] demonstrado através da análise de vários mitos e de sua estrutura que o pensamento primitivo chamado “selvagem” era guiado por uma lógica rigorosa, classificadora. Em Pureza e PerigoDouglas demonstra que o Levítico 11 ilustra perfeitamente essa lógica. [...] Deus declarou a bondade de todas as criaturas animais, inclusive os monstros marinhos, consagrando sua divisão por espécies (Gn 1, 21-25). Por que então o Levítico 11 introduz distinções suplementares entre animais puros e impuros? As diferenças introduzidas no Levítico 11 valem unicamente para o povo que foi “distinguido”: são de ordem prática e se referem ao regime alimentar dos israelitas e à sua prática sacrificial; referem-se a um povo chamado a entrar na santidade de Deus – e em sua “diferença” – entrando num mundo mais rico de diferenças. Uma passagem do Levítico resume essa vocação singular: “Mas a vós digo: Eu sou Javé, vosso Deus, que vos separou destes povos. Haveis de fazer a separação entre animais puros e impuros, e entre aves impuras e puras; para que não vos façais abomináveis, nem com animais nem com aves, nem com o que se arrasta pelo solo; porque vos separei tudo isso como impuro. Sede, pois, santos para mim, porque eu, Javé, sou santo, e vos separei dentre os povos, para que sejais meus” (20, 24-26). [...] Unida às outras distinções introduzidas pelo Levítico, a distinção dos animais limpos e imundos está entre as que colocam os filhos de Israel do lado de [...] um respeito mais atento, aos outros e a si mesmos, do primeiro dom de Deus que é a vida. Uma vez mais, a visão bíblica não sustenta uma religiosidade irracional, mas se revela ligada a uma sábia articulação do mundo, respeitosa das distinções internas da realidade e da finalidade indicada por elas.

* * *

Gênesis 1 poderia, finalmente, ter o subtítulo dado por Karl Popper ao seu último livro: “Questões relacionadas ao conhecimento da natureza”. Adão prolonga a obra criadora da separação das espécies. Desse modo, exercita, à imagem de Deus, o “domínio brando” do mundo que lhe é confiado (1, 28).

Um texto bíblico do Livro dos Reis afirma, além disso, que ele exercita nisto uma função real e, por assim dizer, “científica”. O elogio da sabedoria de Salomão termina com estes versículos: “A sabedoria de Salomão foi maior que a de todos os filhos do Oriente e maior que toda a sabedoria do Egito. [...] Ele compôs três mil provérbios e mil e cinco cânticos. Falou sobre plantas, desde o cedro do Líbano até o hissopo que cresce na parede. Falou também sobre animais, aves, répteis e peixes” (1Rs 5, 10-13). No estado-jardim que são a Judeia e Israel (cf. 1Rs 5, 5), Salomão, cheio da sabedoria que recebeu, prolonga o gesto de Adão que “deu nome a todos os animais, às aves do céu e a todas as feras” (Gn 2, 20) e dá início também ao governo do mundo com a linguagem.

Depois de Herder e Heidegger, não faltaram interpretações que viram nos nomes queAdão dá aos animais o nascimento da vocação poética do homem, a de “habitar poeticamente esta terra” (Hölderlin). Para dizer a verdade, o transfundo cultural da dupla cena (em Gênesis 2 e em 1Rs 5) convida a ver Adão e Salomão representados como poetas e como homens de ciência. A sabedoria enciclopédica de Salomão no citado retrato de 1Rs 5, 12-13 é próxima do saber classificador e da “ciências das listas” dos habitantes da Mesopotâmia, dos quais derivam também os inventores do livro dos Provérbios e dos códices de leis bíblicas.

Dessa “ciência das listas”, elaborada entre o Eufrates e o Tigre, René Labat escreve: “Mesmo que se não estava dirigida à universalidade, ela se encontra na prática estendida a todas as ordens de conhecimento: ciência da natureza nas listas de minerais, de plantas e de animais; ciência das técnicas nas listas de utensílios, de vestidos, de construções, de alimentos e bebidas; ciências do universo nas listas dos deuses, das estrelas dos povos ou bairros, de rios e de montanhas; enfim, ciências do homem nas listas das características físicas, das partes do corpo, dos ofícios e das classes sociais”.

Essa classificação dos fenômenos do real se organiza em particular a partir de seus nomes. Na Bíblia há um eco da atividade criadora de Deus que cria as coisas dando a elas um nome. “O círculo dos conhecimentos de Salomão, zoológico e botânico, é outro jardim de Adão”, escreve Paul BeauchampAdão e Salomão testemunham ambos – um nas origens e o outro na “modernidade” da história – a vocação do homem para habitar “cientificamente” a terra que Deus lhes confiou.

Labat em sua nomenclatura menciona a elaboração das “listas dos deuses”. Mas isto é uma tarefa que não cabe mais ao homem bíblico, cujo único Deus se revela irredutível a fenômenos do mundo. É necessário, com efeito, colocar em relevo como o monoteísmo bíblico transformou a relação do “saber” do homem com o mundo que o circunda: no mundo bíblico a “ciência das listas” tem um novo sentido. Os politeísmos do antigo Oriente Próximo, egípcios, mesopotâmicos e cananeus [...] estavam estreitamente ligados a ambientes cósmicos: o céu, a chuva, as constelações, o ar, o vento, as águas doces. Isto já não é pensável no contexto bíblico: se Deus penetra com seu olhar e seu cuidado o mundo que criou, até nos pontos mais inacessíveis (cf. Jó 38-39), contudo, está “separado” em sua absoluta transcendência (cf. Is 40, 25; 46, 5; 66, 1-2).

As sociedades religiosas do antigo Oriente Próximo se caracterizam, além disso, por um fundo obscuro no qual reinam demônios e forças maléficas. O pensamento bíblico reorientou este dado notavelmente. [...] Liberada das imanências divinas e demoníacas, a terra do homem bíblico lhe é entregue por completo: “Os céus pertencem a Javé, mas a terra ele a deu para os homens” (Salmo 115, 16). Esta lhe é confiada em toda a sua extensão, céu, mar e terra, como canta o Salmo 8, com o dever de investigação que segue: “A glória de Deus é ocultar as coisas, e a glória dos reis é pesquisá-las” (Pr 25, 2). Essa tarefa real do homem bíblico recebe a forma mais “moderna”, quase secularizada, na pesquisa de Salomão, como está representada no livro do Eclesiastes: “Eu resolvi pesquisar e investigar com sabedoria tudo o que acontece debaixo do céu” (Ecl 1, 13). Certamente, tal empresa está distante das ciências modernas: para se tornarem operativas, estas deverão cruzar outros umbrais de racionalidade, começando pela conceptualidade grega. É verdade, entretanto, que o pensamento bíblico da entrega da criação ao saber e ao poder do homem constitui uma das condições da emancipação do saber científico.

* * *

Gênesis 1 é, pois, a seu modo, uma manifestação da inteligibilidade do mundo [...] Este capítulo e os seguintes no Gênesis não afirmam de fato uma forma de competência entre a ciência divina e a do homem. O acesso do homem ao saber da linguagem não é uma prerrogativa roubada da divindade, como um fogo prometeico, não obstante as falsas promessas da serpente em Gn 3, 1-5. A vocação “científica” do homem é, ao contrário, enunciada nos momentos de presença de Deus no homem, como discurso dirigido por Deus a Adão em Gênesis 1, ou como proximidade de Deus ao homem no jardim emGênesis 2, ou como a experiência mística em 1Rs 3, onde Salomão pede a Deus sabedoria, que em particular tomará a forma de seu governo do mundo através da palavra. Este saber não está livre de cair em desvios, mas que procede, sobretudo, do “ser à imagem”, como a tarefa real confiada por Deus a Adão. O Salmo 8 coloca as coisas na justa perspectiva, quando celebra o senhorio de Deus celebrando o do homem: “Tu o fizeste pouco menos do que um deus, e o coroas de glória e esplendor. Tu o fazes reinar sobre as obras de tuas mãos, tudo submeteste a seus pés”.

Para ler mais:

in http://www.unisinos.br/_ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=20820


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publicado por Riacho, em 23.03.09 às 20:26link do post | favorito

23/3/2009
 
É preciso excomungar Jesus. Artigo de Frédéric Lenoir
 

Em artigo para o jornal Le Monde, 19-03-2009, Frédéric Lenoir, filósofo e escritor francês, questiona se, "na Igreja de Bento XVI", Jesus não seria "excomungado por ter pregado a superação da lei com o amor".

Autor de "Cristo Filósofo” (Ed. Caleidoscópio, 2008), Lenoir afirma que "ninguém pede que a Igreja renuncie afirmar as próprias convicções. Mas o que não se entende é a maneira teórica e às vezes brutal utilizada pela hierarquia para reafirmar a norma, enquanto existem apenas situações concretas, singulares e complexas". A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o artigo.

A Igreja católica atravessa uma crise de uma amplitude inédita em muitas décadas. Essa crise é muito mais profunda, já que sua credibilidade é colocada em questão em todos os âmbitos: por nós, católicos, pelas pessoas de cultura católica e pelos fiéis praticantes.

A Igreja não é vítima de uma agressão externa. As causas dos seus males atuais não surgiram por causa de "inimigos da fé" ou de anticlericais. Dois graves escândalos, que se referem à responsabilidade da sua hierarquia, expuseram brutalmente as suas contradições: a revogação da excomunhão de quatro bispos integralistas, dentre os quais um que fez declarações negacionistas, e a excomunhão, quase concomitante, por parte do arcebispo de Recife, de uma mãe e de uma equipe médica que praticou um aborto em uma menina de nove anos, grávida de gêmeos, vítima de estupros, cuja vida estava em perigo.

A isso, acrescentam-se as afirmações de Bento XVI no avião que o levou à África, continente atingido em grande parte pela pandemia da Aids: "Não se pode resolver o problema da Aids com a distribuição de preservativos. Pelo contrário, a sua utilização agrava o problema".

O primeiro caso escandalizou sobretudo pelas declarações negacionistas odiosas de dom Williamson e pelo tríplice erro do Vaticano, que não informou o Papa das palavras conhecidas desde novembro de 2008; que promulgou o decreto no dia 24 de janeiro, quando tais declarações estavam na primeira página de todos os jornais do mundo desde o dia 22 de janeiro; e, enfim, pela lentidão da condenação dessas palavras.

Mas essa revogação de excomunhão "sem condições", preâmbulo de um processo de reintegração na Igreja, também perturbou profundamente muitos católicos ligados ao Concílio Vaticano II (1962-1965) e aos seus valores de liberdade religiosa e de diálogo com as outras religiões, constantemente negados pelos integralistas. Na carta aos bispos publicada no dia 12 de março, o Papa reconhece os erros na gestão do caso Williamson e tenta justificar-se sobre a revogação da excomunhão utilizando o argumento da misericórdia: "Quem anuncia Deus como Amor levado 'até ao extremo' deve dar testemunho do amor: dedicar-se com amor àqueles que sofrem".

Pode-se entender que, em nome da mensagem evangélica, o Papa quer perdoar e dar uma nova chance às ovelhas perdidas que ainda dizem palavras extremistas e intolerantes há anos. Mas então por que a Igreja continua proibindo a comunhão aos divorciados que casam de novo? Por que condena com tal dureza as pessoas próximas de uma menina estuprada que salvaram sua vida fazendo-a abortar? A misericórdia deve ser aplicada só aos integralistas? E como é possível considerar o estupro de uma menina menos grave do que um aborto, que, além do mais, foi realizado em favor da vida?

O escândalo é tal que diversos bispos franceses decidiram intervir para condenar uma decisão iníqua que contradiz não apenas a moral comum, mas também a mensagem evangélica. Basta citar o episódio em que Jesus se recusa a condenar uma mulher adúltera, que, segundo a lei, deve ser apedrejada, e grita aos ultralegalistas da época: "Quem não tem pecado que atire a primeira pedra" (João 8). Ele mesmo transgrediu mais vezes a lei religiosa. Dostoievski havia imaginado que, se Jesus voltasse à Espanha de Torquemada, seria condenado ao fogo por ter pregado a liberdade de consciência. Pergunta-se se, na Igreja de Bento XVI, ele não seria excomungado por ter pregado a superação da lei com o amor.

Ninguém pede que a Igreja renuncie afirmar as próprias convicções. Mas o que não se entende é a maneira teórica e às vezes brutal utilizada pela hierarquia para reafirmar a norma, enquanto existem apenas situações concretas, singulares e complexas. Como destacada dom Yves Patenôtre, bispo da Mission de France, a decisão de excomunhão pronunciada pelo arcebispo de Recife, confirmada por Roma, "despreza a prática tradicional da Igreja católica que é a de escutar as pessoas em dificuldade, acompanhá-las e, em matéria de moral, levar em conta o 'mal menor'". Pode-se dizer a mesma coisa sobre a luta contra a Aids. O uso do preservativo não é, sem dúvida, a solução ideal, mas, de fato, é a melhor defesa contra a difusão da epidemia para todos aqueles que se cansam de viver a abstinência e a fidelidade pregadas pela Igreja. Os padres africanos sabem disso.

A história da Igreja é marcada por essa tensão permanente entre fidelidade à mensagem de compaixão com relação a toda pessoa pelo seu fundador e a atitude dos dirigentes que acabam, muitas vezes, perdendo de vista essa mensagem e privilegiando o interesse da instituição – que se tornou um fim em si mesmo – ou fechando-se em um legalismo meticuloso, absurdo e desumanizador.

O pontificado de João Paulo II foi caracterizado por uma marca de profunda ambiguidade: intransigente e tradicionalista no plano moral e doutrinal, foi também um homem de diálogo e de coração, que multiplicou os gestos fortes com relação aos humildes e às outras religiões. Bento XVI é o herdeiro do seu predecessor apenas na vertente conservadora. E na Igreja de hoje não há mais nem um Abbé Pierre [1] nem uma Soeur Emmanuelle [2], aqueles "fiéis confiáveis", capazes de lançar um grito de protesto contra as decisões dogmáticas desumanizadoras, desenvolvendo portanto um papel catártico e servindo como preciosos mediadores entre os fiéis e as instituições.

Um cisma silencioso ameaça a Igreja à esquerda, muito mais grave do que o dos tradicionalistas. Bento XVI pretendia "reevangelizar" a Europa. Conseguirá, talvez, reconquistar um punhado de integralistas, causando a perda de numerosos fiéis ligados aos valores evangélicos e de indivíduos em busca de sentido, aos quais parece que Roma não sabe oferecer outra coisa a não ser dogmas e normas.

Notas:

1. Henri Antoine Groués, mais conhecido como Abbé Pierre (1912-2007) foi um sacerdote capuchinho francês. Morreu aos 94 anos. Revoltado ao ver que num país rico como a França pessoas morriam de frio na rua, Abbé Pierre, em 1954, pediu apoio nas rádios para salvar os mais pobres de uma morte certa. O seu trabalho de assistência iniciou-se durante a Segunda Guerra Mundial. Recebeu numerosas honrarias, distinções e condecorações militares pelo combate em prol da França. Com a paz, foi eleito deputado da Assembléia Nacional Francesa, que abandonou por protesto contra uma lei eleitoral que ele julgava injusta, em 1951. A partir daí dedicou-se ao Movimento Emaús, que está hoje presente em mais de 40 países. [voltar ao texto]

2. Soeur Emmanuelle (cujo nome de batismo era Madeleine Cinquin) (1908-2008) foi uma irmã belga, que dedicou a vida a ajudar os mais pobres, sobretudo no Cairo. Tendo estudado na Universidade Sorbonne de Paris, Irmã Emmanuelle foi professora de Filosofia e Letras em Istambul, Tunísia, Cairo e Alexandria. Em 1971, quando tinha 63 anos, decidiu compartilhar a sua vida com os pobres do Cairo, no Egito, motivo pelo qual era chamada de "irmãzinha dos mendigos". Em 1993, deixou o Egito, aos 85 anos, e regressou à França, estabelecendo-se na comunidade da Congregação de Nossa Senhora do Sion, para a qual havia entrado aos 20 anos, dedicando seu tempo à oração e à meditação, sem jamais deixar de ajudar os sem-teto e os imigrantes ilegais. [voltar ao texto]

Para ler mais:

in: http://www.unisinos.br/_ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=20766


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publicado por Riacho, em 22.03.09 às 21:13link do post | favorito

Olá

 

As infelizes declarações do papa sobre o uso do preservativo e a propagação da Sida são comentadas por Hans Kung e publicadas na revista Unisinos que se transcreve a seguir.

 

Abraço

 

Carlos

 

21/3/2009
 
‘A História julgará o Papa como responsável pela propagação da Aids na África’. Entrevista com Hans Küng
 

Hans Küng é um dos teólogos mais influentes do mundo. Tanto na sociedade civil como na Igreja, a palavra de Hans Küng nunca deixa ninguém indiferente. Talvez porque, como ele mesmo disse, seu lema seja “ser livre para buscar a verdade”.

No segundo volume de suas Memórias, Verdad Controvertida (Trotta), repassa a sua vida que se entrecruza, aproxima e distancia de outro grande protagonista da história da Igreja, o Papa Ratzinger. Ontem amigo, hoje adversário, de quem diverge em quase tudo e de quem diz que “fracassou”. Mais ainda, garante que “a História julgará João Paulo II e Bento XVI como dois dos maiores responsáveis pela propagação da Aids”.

Segue a entrevista que o teólogo suíço Hans Küng concedeu a José Manuel Vidal e que está publicada no sítio espanhol Religión Digital, 20-03-2009. A tradução é do Cepat.

Professor, qual é a sua opinião sobre a polêmica suscitada pelo Papa Ratzinger ao condenar o preservativo como meio para combater a Aids na África?

A postura do Papa Ratzinger é consequência da Encíclica Humanae Vitae de Paulo VI. Uma Encíclica que excluiu todos os tipos de anticoncepcionais. Esta foi também a posição do Papa Wojtyla e do Papa Ratzinger durante os últimos 30 anos. Mas agora se veem as consequências deste dogmatismo e deste moralismo rigorista do Vaticano.

Dói-lhe especialmente pelas consequências que este moralismo intolerante pode ter no continente africano?

Sim. Me dá muita pena constatar que a História julgará a ambos os Papas como dois dos maiores responsáveis pela propagação da Aids, especialmente em países com grandes maiorias ou minorias católicas, como é o caso da África. É sumamente hipócrita condenar os preservativos em regiões como as africanas com alto risco de Aids e, ao mesmo tempo, querer proteger os pobres das doenças mais nocivas.

Nesse mesmo âmbito da moral, a Conferência Episcopal espanhola acaba de lançar uma campanha contra o aborto que está suscitando muita polêmica. Você a viu? O que lhe parece?

Não conheço a situação a fundo, mas me parece verdadeiramente inútil que o Episcopado espanhol reinicie, novamente, velhas batalhas. Porque a do aborto é uma velha batalha, perdida de antemão. Vi essa nova campanha publicitária do lince, que me parece muito demagógica e, portanto, muito falsa. Além disso, no meu entendimento, é muito prejudicial para a própria Igreja voltar à velha batalha do aborto.

Os bispos espanhóis dizem que o presidente do Governo, José Luis Rodríguez Zapatero, quer impor um laicismo radical e anticatólico.

A hierarquia não tem por que abençoar todas as políticas do Governo. Os bispos podem criticar, mas não insuflar as massas. Se me permitissem dar um conselho, diria que não voltem às batalhas de ontem. O que devem fazer é ver, junto com o Governo, o que é melhor para a Espanha. Sobretudo, na difícil situação social, política e econômica que o país está atravessando.

Uma Igreja como simples autoridade moral.

Evidentemente, o problema para o episcopado espanhol é que passa anos defendendo as posturas intransigentes e rigoristas da direita. A Igreja espanhola precisa é situar-se numa via média razoável.

Ser partidário de uma Igreja samaritana e que dialogue...

Sim. Uma Igreja do diálogo, que aposta no diálogo e com entranhas de misericórdia. Sem converter-se num partido político. A Igreja não pode ser socialista, nem de direita, mas deve buscar a verdade.

No segundo volume de suas Memórias, seu caminho se entrecruza com o do atual Papa Ratzinger, de quem chega a dizer que, como teólogo, “não deu nenhuma contribuição significativa à Teologia”.

Dizer isso não significa dizer que seja um mau teólogo. Mas, creio, que contribui pouco para a evolução da Teologia, porque faz parte daqueles teólogos que só querem conservar a tradição. Ele estudou muito bem Santo Agostinho, São Boaventura e outras teologias tradicionais e neoclássicas, mas sem propor ideias novas. Permanece no paradigma helenístico-romano-católico-medieval, com uma perspectiva muito restrita. Não tem nenhuma simpatia pelos reformadores, é muito cético em relação ao Iluminismo e à modernidade. Neste sentido, ele tem uma visão muito restrita do mundo atual. Enquanto o mundo se move do paradigma moderno a um paradigma pós-moderno ou trans-moderno, ele permanece no antigo paradigma dogmático-helenístico. Em dogmática ele é helenista, e em Governo é romanista-católico, no sentido de promover uma Igreja medieval.

Um Papa absolutista?

Este absolutismo papal não é do primeiro milênio. É uma consequência da reforma gregoriana do século XI. A lei do celibato é do século XI, e o clericalismo extremo também e deste século. A reforma gregoriana fez uma revolução de cima para baixo. O Papa Ratzinger volta, novamente, à missa tridentina, que não é a missa da origem, mas medieval. Essa é a sua situação: ele vê todo o mundo através destas lentes.

E como é o Papa Ratzinger como pessoa?

É um homem extremamente inteligente, muito humano no trato pessoal, com muitas qualidades.

A sua vida e a do Papa foram e são vidas paralelas.

Nossos caminhos foram paralelos e, contudo, muito distintos. De fato, nossas respectivas reações – tão diferentes entre si – aos sinais dos tempos são, até certo ponto, exemplares no que diz respeito ao curso seguido pela Igreja e pela teologia. Está claro que as nossas vidas não estão entrelaçadas pelo destino, nem eu contemplo a minha vida no espelho de Ratzinger. Cada qual vive a sua própria vida. Mas, durante aproximadamente quatro décadas, as nossas trajetórias vitais transcorreram em grande medida em paralelo, para separar-se e voltar a se cruzar mais tarde.

Qual é a diferença fundamental entre ambos?

Na década de 1960, eu, ao contrário de Joseph Ratzinger, tomei a decisão de não me comprometer com o sistema hierárquico romano nem colocar-me a serviço de uma Igreja clerical-centrista.

Quais são os valores essenciais de Hans Küng?

Liberdade e verdade foram e seguem sendo dois valores centrais na minha existência intelectual. Nunca me considerei do número dos “beati possidentes”, daqueles que, cheios de felicidade e orgulho, acreditam estar de posse da verdade. Pelo contrário, me senti solidário com aqueles que buscam a verdade.

Dois valores que o converteram no “enfant terrible” do poder Vaticano. Como vê o atual papado?

Em crise total e sulcado por uma série de erros sumamente graves e que mudaram a posição do Papa na Igreja e no mundo. De tal forma que, pela primeira vez na História, o Papa teve que se defender escrevendo uma carta aos bispos, na qual reconhece que é um Papa falível.

Erros de comunicação, como dizem alguns, ou de governo?

Evidentemente, trata-se de erros de governo. E erros graves, que vão desde ofender os muçulmanos em Regensburg, os protestantes, os indígenas, e agora os judeus, com o caso dos bispos lefebvrianos.

O caso dos lefebvrianos é especial?

Sim, porque ilustra perfeitamente o temor e a constatação de muitos fieis de que Bento XVI quer relativizar o Concílio Vaticano II. E a verdade é que iniciou uma clara política de restauração.

Você acredita que está regredindo?

É evidente em muitas coisas. Por exemplo, na restauração da liturgia medieval, que não é a liturgia autêntica. No início, a liturgia romana era a grega. Mas a que ele reintroduziu é a missa tridentina. Um sinal claro de involução.

A situação do Papa não lhe dá pena?

Me dá muita pena, porque o conheço intimamente. Não faz muito tempo, estive com ele em Castelgandolfo, em conversa amistosa. Sempre pensei que seria um Papa conservador, mas também que faria algumas reformas. Mas não fez nenhuma reforma, e, ao contrário, cometeu muitos erros. Estou convencido de que um Papa poderia ser o inspirador de toda a Cristandade. Mas isso é algo que esqueceu. Tudo é verdadeiramente muito triste. E, para ele, muito duro pessoalmente.

E para os fieis também não é duro?

Sim, mas ele, em sua carta, mostra somente uma dor pessoal, não vê a dor das pessoas. As dores de mais de 100.000 sacerdotes casados, que são excluídos do ministério. Não vê as dores dos divorciados. Não vê as dores das mulheres que têm que usar anticoncepcionais. Não vê a dor dos teólogos da Libertação, que ele, como cardeal, marginalizou e tratou de maneira não muito cristã. Ele vê somente sua própria dor, seu próprio universo. Ele vê tudo desde o Palácio Pontifício, e praticamente não vê o mundo como é na realidade.

Como pode a Igreja recuperar o espírito de João XXIII e a primavera conciliar? Com um novo Concílio, talvez?

Isso é muito difícil. Porque o sistema das nomeações episcopais é um problema crucial. Não resta nele nenhum elemento democrático das origens da Igreja, quando vigorava o princípio “nenhum bispo imposto”. Agora, todo o episcopado é imposto e conformista. Porque os critérios para a escolha episcopal são: aceitar a Humanae Vitae e a lei do celibato e ser contrário à ordenação de mulheres. Tudo isso produz um Episcopado muito conformista. E o Colégio Cardinalício também é formado apenas por pessoas que fazem parte da política romana.

Mesmo sendo difícil, há alguma possibilidade de renovação eclesial?

Há duas possibilidades. Uma, que as comunidades e paróquias toquem fundo e fiquem sem clero e sem eucaristia. Nessa situação catastrófica, é possível que surja um “João XXIII”. A outra possibilidade é que a atual situação provoque mais e mais reações e protestos. Que as pessoas se manifestem por um Concílio Vaticano III, pelo aggiornamento e pelo diálogo. Em qualquer caso, não será nada fácil.

Teólogos como você têm poder?

Claro que têm. O teólogo tem poder e pode abusar dele.

Que tipo de bispo necessitamos hoje?

Um episcopado que não dissimule os notórios problemas da Igreja, mas que os chame abertamente pelo seu nome e os aborde energicamente.

E que Igreja?

A Igreja do presente e do futuro necessita aggiornamento e não tradicionalismo da fé e da doutrina moral; colegialidade do Papa com os bispos e não um centralismo romano autoritário; abertura ao mundo moderno e não de novo uma campanha antimodernista; diálogo também no interior da Igreja católica e não de novo a Inquisição e a negação da liberdade de consciência e de ensino; ecumenismo e não de novo a proclamação arrogante de uma única Igreja verdadeira. Porque não existe apenas a ditadura do absolutismo, que muitos vêem corporificada no culto pessoal ao papado. Nenhuma destas ditaduras corresponde à verdade cristã.

Para ler mais:

in: http://www.unisinos.br/_ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=20726


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publicado por Riacho, em 19.03.09 às 23:25link do post | favorito

 O parlamento dinamarquês aprovou esta terça feira, por 62 votos a favor e 53 contra, a adopção de crianças dinamarquesas e estrangeiras por casais homossexuais, disse fonte parlamentar.

O governo liberal conservador e o seu aliado parlamentar, o Partido do Povo Dinamarquês (extrema direita) eram contra, mas os liberais deram liberdade de voto aos seus deputados, o que possibilitou a vitória da oposição nesta votação.

«É um grande passo e o penúltimo obstáculo levantado no caminho da igualdade entre os casais homossexuais e heterossexuais», declarou o deputado Simon Emil Ammitzboell, que apresentou o projecto-lei.

«Num futuro não muito longínquo, a Dinamarca autorizará os homossexuais a casar na igreja», acrescentou.

A Dinamarca foi o primeiro país do mundo a autorizar o casamento civil dos homossexuais em Outubro de 1989, dando-lhes os mesmos direitos que os heterossexuais à excepção da inseminação artificial e a adopção.

O ministro da Justiça, Brian Mikkelsen, considerou que esta lei «simbólica e desprovida de sentido» porque nenhum dos países que cooperam com as agências dinamarquesas de adopção vai autorizar entregar crianças a casais homossexuais.

Esta opinião foi rejeitada pela oposição.

«Pensamos concluir acordos bilaterais, país por país, e esperamos que dentro de cinco a dez anos algumas pessoas sejam suficientemente progressistas para aceitar a adopção de crianças por homossexuais», acrescentou Ammitzboell.

Diário Digital / Lusa 

in: http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?section_id=10&id_news=378374

 

 


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publicado por Riacho, em 19.03.09 às 23:18link do post | favorito

 ROMA, 17 MAR (ANSA) - O presidente da Associação Lésbica e Gay Italiana (Arcigay), Aurelio Mancuso, criticou nesta terça-feira as declarações do papa Bento XVI de que a Aids não pode ser combatida com distribuição de preservativos. 

    "Enquanto no mundo, e principalmente na África (local para onde o Pontífice viajou na manhã de hoje), milhares de pessoas morrem de Aids, Bento XVI não encontra nada melhor do que reafirmar a posição do Vaticano contra a distribuição de preservativos, que, segundo o Papa, é considerada uma ação que aumenta os problemas", criticou Mancuso.
    O Pontífice viajou nesta terça-feira a Camarões, como parte de sua viagem pela África. Durante o voo , Bento XVI defendeu que a Aids "é uma tragédia que não pode ser superada com o dinheiro e nem com a distribuição de preservativos, que desse modo aumenta os problemas" e reiterou que a doença só pode ser curada com uma renovação moral no comportamento humano.
    De acordo com o presidente da Arcigay, "principalmente na África, na ausência de recursos adequados, de políticas de prevenção e de distribuição nas farmácias de produtos que impedem o desenvolvimento agressivo da doença, a Aids assume os traços verdadeiros de uma pandemia".
    "O comportamento humano moral e correto evocado pelo Papa é sempre o habitual: abstinência e posição política que até agora somente contribuíram para agravar a desastrosa situação africana", criticou Mancuso.
    O presidente da associação italiana também se referiu a outra declaração do Pontífice, em que Bento XVI expressou seu desejo de "sofrer com os sofredores".
    "Se o Pontífice quer 'sofrer com os sofredores', vá visitar um hospital do continente africano em um dia infernal, cheio de pessoas morrendo e atrocidades dolorosas, ao invés de fazer um passeio turístico diplomático. Talvez assim possa mudar de opinião", afirmou Mancuso. (ANSA)
17/03/2009 09:51 

in: http://www.ansa.it/ansalatinabr/notizie/fdg/200903170951341264/200903170951341264.html

 


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publicado por Riacho, em 17.03.09 às 19:45link do post | favorito

 

17/3/2009
 
Jeffrey Weeks. Sexualidade, militância e direitos humanos
 

Agora que está na boca de todos a luta homossexual de Harvey Milk (1930-1978) levada ao cinema [trata-se do filme Milk – a voz da igualdade], paramos para falar com Jeffrey Weeks, intelectual britânico, eminência em história e cultura da sexualidade.

Tem o aspecto discreto de quem quer passar despercebido. Bem vestido, blusão azul, gravata clássica, óculos de professor universitário e um falar extremamente correto interrompido por contidas risadas. Parece um empregado de banco ou um funcionário que perambula despistado pelos corredores do Caixaforum. Mas Jeffrey Weeks é, possivelmente, uma das pessoas mais ousadas do panorama britânico dos últimos 40 anos.

Nascido em Gales há 63 anos, viveu sua infância e adolescência num ambiente mineiro de homens duros e conservadores em que logo descobriu que sua sexualidade “era diferente”. Assim que, logo depois decidiu que devia fugir para Londres, onde poderia estudar e viver em liberdade. No começo dos anos 1970 começou a militar na Frente de Libertação Gay, e decidiu confessar publicamente a sua homossexualidade, algo pouco convencional naquela época. A partir de então essa militância e a divulgação da organização da sexualidade na história e na vida íntima das pessoas foram os motores inseparáveis da vida deste sociólogo e historiador, catedrático emérito da London South Bank University. Há muitos anos está escarafunchando nos segredos da paisagem sexual e suas incessantes modificações sociais e culturais. Viveu uma autêntica revolução, desde uma infância onde nem sequer podia falar de sexo até poder dizer bem alto que tem uma relação de fato com outro homem.

Jeffrey Weeks é membro de diversas Academias e Comitês Universitários, e publicou inúmeros artigos e mais de dez livros sobre a influência da história e da cultura na sexualidade.

Weeks esteve em Madri numa das frias tardes de janeiro para falar justamente de sexualidade e gênero num ciclo organizado pelo Caixaforum.

A entrevista é de Malén Aznárez e publicada no jornal espanhol El País, 22-02-2009. A tradução é do Cepat.

Eis a entrevista.

Como viveu tanta mudança social?

Os vales do sul de Gales, onde nasci, eram a zona de carvão mais famosa do mundo e tinham uma cultura que girava em torno desse mineral: intensa solidariedade entre os mineiros e divisão estrita entre homens e mulheres. Era uma sociedade quente, comunitária, de apoio, mas muito conservadora do ponto de vista social, conservadora em relação às questões de gênero e sexualidade. Era muito difícil conceber um tipo de vida diferente, era um mundo em si mesmo, e os principais meios de escape chegavam pela educação. Eu fui um jovem esperto, fui à melhor escola da região, e com 18 anos pude ir à Universidade.

Dessa maneira escapou daquele mundo fechado. Os da sua casa eram mineiros também?

O ambiente era mineiro. Os pais de minha mãe tinham sido mineiros, mas meu pai trabalhou numa fábrica toda a sua vida. Minha mãe cuidava de nós, mas também tinha trabalhos de meia jornada em comércios. Era uma família clássica da classe trabalhadora. Tenho um irmão dois anos menor que eu, e aos 18 anos tive outro irmão. Minha mãe continua morando no mesmo lugar de Gales, e meus irmãos também. Eu fui para Londres como estudante e ali fiquei. Escapei de algum modo, sim... Mas continuo tendo profundas relações com a minha família. Ir a Londres me permitiu explorar a minha sexualidade, mesmo que durante muitos anos não contasse para a minha família que eu era homossexual. Ou seja, vivi duas vidas, a galesa, onde era o filho, o filho inteligente, e depois vinha a vida londrinense, onde vivia minha homossexualidade de um modo aberto estabelecendo amizades e relações.

Como viveu seu despertar homossexual nos anos 1950 e num ambiente como aquele que descreve?

Sabia que era homossexual desde os 16 anos, e tive algum encontro sexual com companheiros de colégio, mas minha vida gay iniciou em Londres. Mesmo assim, nos primeiros anos de Londres, nos anos 1960, seguia sendo uma vida semi-secreta; alguns de meus amigos sabiam que eu era gay, mas em geral vivi dentro do armário essa parte da minha vida.

Suponho que se necessitava de muita coragem para sair então do armário e que pouquíssimas pessoas o faziam.

O ponto de inflexão se deu com a minha participação, em novembro de 1970, no Movimento de Libertação Gay. A razão pela qual participei desse movimento foi que as primeiras reuniões aconteceram na London School Academy, onde eu trabalhava e que foi, inclusive, o meu primeiro emprego. Assim que foi um passo fácil. Ia do trabalho diretamente às reuniões... Evidentemente, foi uma revolução em nossas atitudes, em minha atitude frente à sexualidade e à política, mas também na minha vida pessoal. Numa das primeiras reuniões, conheci Angus Suttie, minha primeira relação duradoura, que mais adiante se converteu num ceramista muito famoso. A ideologia do Movimento de Libertação Gay era ser aberto, assim que eu me aproximei dos meus colegas de trabalho e lhes expliquei, e depois, pouco tempo depois, fiz o mesmo com meus pais.

E como reagiram?

Primeiro, contei-o ao meu pai porque pensei que seria o mais difícil. Me respondeu que não gostava do fato de ser gay, mas que gostava de mim e o aceitava na condição de não fazer muito escândalo em Gales... Minha mãe disse algo parecido. E o interessante é que ambos o tinham suspeitado, mas nunca tinham falado entre si sobre o assunto.

Costuma ser algo bastante habitual, o que não se fala não existe...

Sim, sim, é bastante comum. Apesar de que tinham muito boa relação e falassem muito entre si, não o fizeram. E depois comecei a escrever sobre sexualidade, sobre homossexualidade, e me tornei conhecido. No final dos anos 1970, as pessoas me conheciam pelos meus escritos, e minha mãe e o resto da minha família, porque meu pai já havia morrido, se sentiram muito orgulhosos pelo fato de ser um escritor de sucesso, ainda que se sentissem, por vezes, em apuros.

Ser famoso ou reconhecido sempre facilita as coisas, não?

Os anos 1980 foram um período difícil por causa da aids, assim que havia certa ambivalência: por um lado, orgulho; por outro, vergonha. Mas o importante foi que nunca me rechaçaram e sempre me senti apoiado. Creio que tenho uma família que me ama; não eram muito religiosos, nem políticos, o espírito era de apoio, e houvesse o que quer que seja apoiavam o seu filho. E continua sendo assim até hoje. Agora que tenho uma união de fato com Mark McNestry, minha mãe fala de nós como se estivéssemos casados; ela gosta de Mark. E minha família nos aceitou como casal. As coisas mudaram muito nos últimos 20 anos.

Quando fiz 60 anos, fiz uma festa e reuni pela primeira vez as duas famílias em Londres, a de Mark e a minha. Foi uma afirmação importante da minha relação e da aceitação por parte das duas famílias. A família de Mark é católica e, no princípio, quando ele saiu do armário, sofreram muito. Mas como gostam dele, acabaram aceitando, e a mim; como parte de pleno direito da família, sou um membro a mais e isso é importante. Mas foi uma grande luta de 40 anos.

Na Espanha travou-se uma forte luta pelo reconhecimento legal das uniões homossexuais; a Igreja católica e a direita conservadora se opuseram duramente. Você tem uma união estável de fato. Dá alguma importância a essa diferença de linguagem?

No Reino Unido, ser casal de fato é como ser um casal, simplesmente é uma forma de chamá-lo. Não se chama casamento por pragmatismo político. Creio que em algum momento se chamará também casamento, mas dessa maneira era mais fácil que passasse no Parlamento, é o que chamo de liberalismo um pouco soterrado...

Mas na Espanha, onde são muito mais religiosos, a luta também se dá na linguagem, chamá-lo de casamento é importante porque se converte no centro de uma luta simbólica. Eu o vejo como uma busca de legitimidade e aceitação. Na primeira fase do movimento homossexual tratava-se de explorar a nossa sexualidade, do reconhecimento de nossos direitos sexuais e sua legitimação. No momento em que isso já está aceito, a segunda fase, na qual nos encontramos agora, é conseguir a aceitação e a afirmação de todas as relações. E creio que foi por isso que a luta pelo reconhecimento de fato, pelo casamento, foi tão central. É o que chamo de marco relacional em vez de marco sexual, passamos dos direitos sexuais aos direitos relacionais.

Você se considera um novo guru da sexualidade? No último século houve muitos, Freud, Reich, Foucault, para citar apenas alguns, que influíram em nossas vidas.

Essa comparação me dá vergonha... Freud, por exemplo, fazia parte de um grupo de sexólogos que também influenciaram, e frequentemente nos esquecem e só nos lembramos de um nome. Eu me vejo como fazendo parte de um processo mais democrático no debate sobre a homossexualidade, como parte de um movimento mais amplo, intelectual e político, para ajudar a progredir. Não me vejo como um grande guru. Mas é bom e bajulador que as pessoas leiam os meus livros ou que me entrevistem, porque deste modo espero ajudar a divulgar as ideias que represento ou defendo.

Você disse que na construção da sexualidade e de gênero, a natureza tem pouco a ver. É bastante surpreendente...

Digo isso para criar polêmica, para nos forçar a pensar sobre a importância da história, da sociedade e da cultura na hora de configurar as nossas crenças e valores sexuais. Evidentemente, creio na importância do corpo e suas possibilidades biológicas para o prazer e a dor, e reconheço que há diferenças biológicas e físicas entre os homens e as mulheres que abrem possibilidades distintas. E também creio, influenciado por Freud e a psicologia, que há sentimentos inconscientes. Assim que penso que a sexualidade é a fonte de três grandes forças: possibilidades biológicas, processos psicológicos e, em terceiro lugar, a parte que foi esquecida ou menosprezada, a parte da história, da sociedade e da cultura.

Parece que chegou seu momento, o da história e da cultura.

No passado, os aspectos culturais foram com frequência marginalizados ou esquecidos, e eu, como sociólogo, trabalhei durante muitos anos para destacar a importância da história. Se estás interessado em temas de identidade, precisas reconhecer o poder e a importância do social, do cultural, porque as identidades não existem na natureza. As possibilidades sim, biológicas e psicológicas.

Para você, as identidades sexuais são sempre sociais?

Sim, sempre. Quando falamos de identidades nacionais não falamos de possibilidades biológicas, falamos do modo como, através da história, surgiram identidades que não estão necessariamente relacionadas nem com a genética nem com a biologia, e vemos que as identidades mudam, se fazem na história. O mesmo acontece com a identidade sexual. Por exemplo, há muitas pessoas que têm práticas homossexuais e não têm uma identidade gay, e há pessoas com identidade gay que não necessariamente têm sexo gay. Não há uma relação necessária entre uma e outra coisa, e isto é porque as identidades se configuram na história.

Mas geralmente se seguem identificando as identidades de gênero com as sexuais...

A maioria das pessoas acha mais fácil dizer: nasci assim e o modo como atuo está ditado por minha biologia. Creio que existem perigos nessa atitude. Por exemplo, historicamente os violentadores justificaram seu comportamento baseando-se em urgências sexuais incontroláveis, mas eu não creio nisso. Penso que a violação é o resultado de fatores sociais, porque nem todos os homens são violentadores. E é óbvio que alguns homens têm um problema sexual que deriva de sua infância, de sua interação com os outros, que configurou sua atitude diante das mulheres e que fez com que odiassem as mulheres. Mas isso não é inerente a todos os homens, não é um tema biológico. É importante ver o porquê de nosso comportamento sexual no gênero e ver como vai mudando com o tempo.

Por exemplo?

Vou dar um exemplo de minha própria família. Meu irmão mais próximo por idade se casou, teve filhos, e nunca fez nada para educá-los. Isso era coisa da mulher, que se ocupava de criar e educar os filhos. E era assim que se comportavam os homens nos anos 1970 e 1980. Ao contrário, meu irmão mais novo se ocupou muito com a educação de seus filhos desde que eram muito pequenos, banhava-os, colocava-os para dormir, compartilhava totalmente as tarefas de ser pai. E agora meu irmão maior, que tem duas netas, se comporta com elas como meu irmão menor: leva-as para a escola, as faz dormir, leva-as para as férias; mudou porque a cultura mudou. E é terno com suas netas, muito mais do que foi com suas próprias filhas.

É evidente que a cultura mudou os papéis tradicionais do masculino e do feminino, mas quanto à sexualidade, muita gente continua a se fazer a clássica pergunta: é uma opção ou é determinada pela biologia?

É uma discussão que já leva mais de cem anos... Eu faço uma diferenciação. Os desejos, os sentimentos, as pulsões, podem ou não ser determinados pelos genes ou pelas distintas influências, as provas científicas não são conclusivas neste campo. O que está claro é que a escolha de querer levar um estilo de vida homossexual ou não é uma escolha social. Ou seja, é preciso fazer uma distinção entre as possibilidades, que são biológicas, e as identidades que escolhemos.

O corpo se converteu num fetiche, moda, publicidade, saúde, esporte... Essa potencialidade do corpo, do erotismo e da sexualidade, se traduz em mudanças reais na sexualidade ou é puro invólucro consumista?

Creio que houve uma mudança profunda sobre onde reside a autoridade na sexualidade. No passado, a maioria da população aceitava uma autoridade tradicional sobre como deveria viver ou comportar-se. E vimos nos arquivos da Igreja, que reconhecia que as pessoas faziam coisas não permitidas, mas a sociedade era dominada por valores tradicionais. Hoje, tudo mudou, porque a maioria das fontes de autoridade tradicional, tanto na Igreja, no Estado ou outros tipos de autoridade como a médica, foram questionados. Houve um longo processo de democratização e secularização, e na maioria dos países ocidentais já não vivemos em sociedades religiosas; a religião ainda é poderosa, mas a maioria das pessoas tem valores seculares. Podemos separar muito mais as nossas crenças religiosas de nosso comportamento individual. Por quê? A razão fundamental, e é uma grande mudança social, é porque em vez de uma fonte de autoridade, agora temos milhares em nossas vidas individuais.

Em geral, a sociedade, ao menos a espanhola, parece que evoluiu muito rapidamente neste aspecto.

Muitas pessoas se confundem um pouco e buscam normas mais estritas, mas muitas outras encontram a possibilidade de desenvolver uma vida mais criativa, cometem erros e as relações se rompem e começam novas, e seguem e seguem inventando. Essencialmente, creio que as pessoas são profundamente morais, mas a maioria já não aceita que a moralidade seja ditada por uma autoridade, mas que vive tomando suas próprias decisões morais. O que vemos é a emergência do que chamo de moralidade de base, ou melhor, moralidades de base, no plural.

Fala de diversidade sexual e moral, mas isso é algo que apavora muita gente, e também os poderes...

A Igreja e o Estado sempre reconheceram a diversidade sexual. A Igreja sempre mostrou uma lista das coisas que eram legítimas e ilegítimas, e o Estado contou com leis que reconheciam a existência da diversidade. Inclusive a Igreja católica reconhece a existência do que chamam de “orientação homossexual”, e diz que devemos amar o pecador e odiar o pecado... O que mudou não é a existência da diversidade sexual, mas o modo como a tratamos.

E como a tratamos?

Assim como eu o vejo, nos últimos anos reconhecemos a realidade da diversidade sexual, mas continua sendo difícil acompanhar o valor ou valores que pode supor, ainda que creio que temos dado importantes passos nesta direção, para não citar os passos que foram dados na Espanha e em outros países em relação às uniões homossexuais. A lei aceita muito melhor inclusive outros tipos de diversidade, como o sexo masoquista, ou outros tipos de comportamentos, como o sexo fora do casamento ou as famílias homoparentais. Tudo o que na minha infância eram tabus sexuais, agora são aceitos na maioria dos países da Europa, assim que estamos indo na direção de uma maior aceitação da abertura e diversidade. Hoje os livros de medicina têm dificuldade para definir o que é perverso, o que significa que não podemos tomar decisões sobre o que é apropriado ou inapropriado, bom ou mau. Mas onde se produziu a grande mudança não foi tanto no que se faz, mas no como se faz.

O que é que nos preocupa agora?

Hoje já não estamos mais tão preocupados sobre se somos homossexuais ou heterossexuais, mas em se a relação que estabelecemos é positiva. E estamos mais preocupados com o abuso e a violência do que no passado; por exemplo, sobre o incesto, buscamos uma proteção para as crianças. Não abandonamos os valores, a moral e a ética, simplesmente temas distintos nos preocupam.

Menciona as perversões, são temas que ainda são falados em voz muito baixa...

Se voltamos cem anos na história, vemos que os sexólogos pioneiros estavam muito preocupados em definir as perversões, que naquela época eram muito similares aos pecados enumerados pela Igreja. Mas nos últimos vinte ou trinta anos, a maioria dos cientistas e as atitudes médicas, se afastaram da tentativa de definir uma perversão exceto em termos de algo que inclua a força ou a violência contra outros. Diz-se que a única coisa que se pode chamar de perversão é o que é imposto com violência contra outro. Nos manuais oficiais de diagnóstico, pouco a pouco foram eliminando o que costuma ser considerado como perversões, e a homossexualidade foi um dos primeiros exemplos. Primeiro era um pecado; depois, uma perversão, e agora é considerada uma variação, entre outras, da sexualidade. Onde não se deu foi, claro, na pedofilia, porque se trata da imposição de valores adultos, não podem entrar no mesmo debate porque é um nível relacional diferente. Preocupa-nos o contexto; o importante é a escolha livre, o consentimento, e repudiar o poder e a violência.

Em suas conferências você afirma que as mulheres, apesar da revolução feminista, continuam tendo no fundo de sua cabeça um homem que os chama à submissão. É também uma provocação ou acredita que seja verdade?

A afirmação vem de um trabalho realizado por uma colega, Janet Holland, e sua equipe, que entrevistaram mulheres sobre suas atitudes sexuais e encontraram que, mesmo que afirmassem suas próprias opções, admitiam que, em última instância, tinham dificuldades para se afastar dos valores tradicionais numa relação com um homem. Seguiam, de algum modo, submetidas aos homens em muitas situações. Janet explica que não é algo biológico e inevitável, mas que simbolicamente é como se ainda houvesse um homem na cabeça das mulheres, algo que as debilita na hora de resistir aos valores tradicionais. Muitas mulheres reconheciam que tinham que lutar constantemente contra isso.

Parece que é mais difícil às lésbicas se tornarem visíveis do que os homossexuais varões. Funciona aqui a dupla marginalização?

Creio que o movimento homossexual feminino emergiu das sombras nos últimos 20 anos. Historicamente, sempre foi mais fácil para os homens explorar a sua sexualidade do que para as mulheres, e isto se deve a que a nossa atitude em relação à sexualidade está muito baseada em supostos de gênero: os homens são ativos, e as mulheres, passivas. E, socialmente, no passado era muito mais fácil para os homens afastar-se das atitudes familiares tradicionais e ter sexo fora da família, que é o que aconteceu até o final do século XX. A maioria dos homens que tinha relações homossexuais também estava casado, mas era impossível para as mulheres que estivessem casadas ter relações sexuais fora do casamento, porque isso teria representado um desastre econômico, social e moral. Assim que podemos dizer que o mundo gay masculino está mais desenvolvido do que o feminino. Muitas das lésbicas que conheço continuam explorando sua sexualidade. Estamos em momentos diferentes do desenvolvimento histórico.

São os transexuais o desafio pendente à invisibilidade e legalidade?

O transgênero sempre fez parte do conflito dos temas gay, desde os primeiros dias da libertação. Mas enquanto o nosso movimento se expandiu e adotou diferentes formas, o aumento dos movimentos transexuais ou transgênero representou nos últimos anos uma volta aos objetivos radicais do início que questionavam o elemento permanente do gênero. Mas, simplesmente creio que é um aspecto do debate amplo sobre os significados do gênero e da sexualidade.

A promiscuidade dos homossexuais se converteu num tópico, é uma reação frente à anterior falta de visibilidade ou obedece a outros questões sexuais?

Não acredito que a promiscuidade seja necessariamente algo associado aos homossexuais. Sei que muitos homossexuais têm múltiplos parceiros, mas também conheço muitos que são monogâmicos. Não acredito realmente que os homossexuais sejam mais promíscuos que os heterossexuais, o que se poderia dizer é que há menos limitações. Até há pouco tempo eram impedidos de se casarem, e era mais fácil explorar a sexualidade em distintas atividades. A cena sexual baseada em parceiros distintos foi um modo de explorar a sexualidade num mundo em que a homossexualidade havia sido reprimida. Há homens promíscuos homossexuais e heterossexuais; não acredito que a cena gay masculina seja definida pela promiscuidade.

Parece que os valores da sexualidade estão se libertando numa paisagem remodelada no que devemos aprender a navegar sem mapas. Como vê essa paisagem?

As relações falham, há relações que fracassam, e isto sempre aconteceu e talvez aconteça mais hoje do que no passado pela falta de bons mapas. Mas, apesar de tudo, as pessoas vivem tentando ter relações e a paisagem hoje é mais um grande continente com diferentes populações que coexistem. Algumas vezes se constroem novas formas de identidade, às vezes se constroem muros em torno de suas vidas... É uma paisagem confusa e muitas vezes é difícil encontrar o caminho, mas creio que a pluralidade é o que define nosso ambiente, e não temos outro remédio que aprender a viver com ele.

in: http://www.unisinos.br/_ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=20411


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publicado por Riacho, em 16.03.09 às 21:40link do post | favorito

Olá

 

A excomunhão justifica-se ou não? O Vaticano apoiou prontamente o bispo brasileiro mas agora o Vaticano vem dizer que o médico não merecia a excomunhão. O que se passa afinal com a hierarquia católica? Porquê a pressa em condenar? A que designios obedecem afinal os nossos pastores?

 

Segue a notícia da unisinos.

 

Abraço

 

Carlos

16/3/2009
 
Médico não merecia a excomunhão, diz Vaticano
 

Em artigo publicado anteontem no "Osservatore Romano", jornal oficial do Vaticano, o bispo Rino Fisichella afirmou que o médico brasileiro responsável pelo aborto realizado na garota de nove anos abusada sexualmente por seu padrasto, em Pernambuco, não merecia a excomunhão, pois salvou sua vida.

A notícia é dos principais jornais do mundo como El País, La Repubblica, Il Corriere della Sera, 15-03-2009.

A nota do arcebispo, que preside a Pontifícia Academia para a Vida, causou surpresa, já que as regras da Igreja Católica ordenam a excomunhão automática em casos de aborto.

Como se dirigisse à garota, Fisichella escreveu: "Há outros que merecem a excomunhão e o perdão, não aqueles que salvaram sua vida e a ajudarão a recuperar a esperança e a fé".

O monsenhor avaliou que a vida da criança estaria em perigo se a gestação fosse levada adiante. E foi enfático em sua defesa, pedindo respeito ao médico e à mãe da garota, que são católicos e foram condenados publicamente. "Antes de pensar em excomunhão, era necessário e urgente salvar aquela vida inocente e trazer de volta sua dignidade, algo que, nós, da igreja, deveríamos ser experts e mestres em proclamar", disse.

Fisichella criticou o anúncio público de excomunhão feito pelo arcebispo de Olinda e Recife, d. José Cardoso Sobrinho no início do mês. Para ele, a garota "deveria ter sido, acima de tudo, compreendida e tratada com delicadeza para fazê-la sentir que todos nós, sem distinção, estamos ao seu lado".

O arcebispo diz que o aborto não-espontâneo é "sempre condenável pela lei da moral como um ato intrínseco do mal", mas não havia necessidade de tanta urgência e publicidade.

A menina passou pela cirurgia no dia 4. Estava grávida de gêmeos. Ela, a mãe e a irmã, de 14 anos, estão abrigadas em local não divulgado, sob tutela da Secretaria Executiva da Mulher. O padrasto, que confessou à polícia ter abusado da menina e da irmã por três anos, está preso. Não foi excomungado.

in: http://www.unisinos.br/ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=20630


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publicado por Riacho, em 16.03.09 às 21:26link do post | favorito

A Associação ILGA Portugal – Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual e Transgénero está a organizar, com o patrocínio da Embaixada do Reino dos Países Baixos em Lisboa, o alto patrocínio da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género e o apoio da Câmara Municipal de Lisboa, a Conferência «Mainstreaming LGBT Anti-Discrimination Policies – Políticas Integradas contra a Discriminação das Pessoas LGBT», que decorrerá nos dias 27 e 28 de Março, no Auditório do Centro de Informação Urbana de Lisboa.
 
O propósito desta Conferência é enfatizar, através da apresentação de boas práticas em países como Espanha, Holanda, Bélgica, Reino Unido ou Estados Unidos da América, que a cidadania plena das pessoas LGBT requer políticas integradas de luta contra a discriminação com base na orientação sexual e na identidade de género, que deverá ser uma preocupação transversal aos diversos sectores de intervenção pública - incluindo a segurança, a justiça, o trabalho, a solidariedade social, a educação e a saúde.

Este evento, que conta com a participação de representantes de Governos e de estruturas governamentais de vários países da União Europeia, bem como de investigadoras/es de renome internacional, terá certamente uma repercussão alargada e será, cremos, um contributo sério para a luta contra a discriminação em Portugal.

Mais informações e actualizações permanentes em
http://www.ilga-portugal.pt/conferencia2009/ ou pelo telefone 969 367 005

Contamos com a sua colaboração na divulgação e participação nesta conferência.

Pela Direcção da Associação ILGA Portugal
Paulo Côrte-Real, Presidente


Conferência "Políticas Integradas contra a Discriminação das Pessoas LGBT / Mainstreaming LGBT Anti-Discrimination Policies"
Centro de Informação Urbana de Lisboa (Picoas Plaza)
27 e 28 de Março de 2009

 

Dia 1 Sexta-feira, 27 de Março de 2009

9h-9h30 Boas-Vindas e Inscrição

9h30-10h Sessão de Abertura
António Costa*, Presidente da Câmara Municipal de Lisboa
Elza Pais, Presidente da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género
Robert Jan van Houtum, Embaixador do Reino dos Países Baixos em Lisboa
Paulo Côrte-Real, Presidente da Direcção da Associação ILGA Portugal

10h-11h20 Painel 1 – em boas mãos: Segurança, Justiça e as Pessoas LGBT
Moderação: Miguel Pinto, Dirigente da Associação ILGA Portugal
Intervenções: Paul M Cahill MBE, Chief Inspector, Presidente da Gay Police Association (Reino Unido)
Victor Argelaguet, Guàrdia Urbana de Barcelona, Presidente da GayLesPol, Secretário da European Gay Police Network (Catalunha, Espanha)
Fernando Grande Marlaska, Juez Instructor de la Audiencia Nacional (Espanha)
Comentário: Rui Sá Gomes*, Secretário de Estado da Administração Interna (Portugal)

11h20-11h30 Pausa para café

11h30-13h Painel 2 – um pé na porta: o Acesso das Pessoas LGBT ao Trabalho e à Solidariedade Social
Moderação: Luísa Corvo, Coordenadora do Grupo de Intervenção Política da Associação ILGA Portugal
Intervenções: Joke Swiebel, ex-Eurodeputada e ex-Presidente do Intergrupo LGBT do Parlamento Europeu (Países Baixos)
Ronald Holzhacker, University of Twente, Senior EU Expert, Network of Socio-Economic Experts in Anti-Discrimination
Luisa López, Division Director - Human Rights & International Affairs, National Association of Social Workers (EUA)
Comentário: Edmundo Martinho*, Presidente - Instituto de Segurança Social, I.P. (Portugal)
Alexandre Rosa*, Vice-Presidente - Instituto do Emprego e da Formação Profissional, I.P. (Portugal)

13h-14h30 Almoço

14h30-16h15 Painel 3 – mens sana in corpore sano: Educação e Saúde Inclusivas
Moderação: Maria José Alves, Associação para o Planeamento da Família/Médicos pela Escolha
Intervenções: Evelyne Paradis, Policy Director - ILGA Europe
Rita Paulos, porta-voz e ex-Presidente da rede ex aequo (Portugal)
José Maria Nuñez Blanco, Fundación Triángulo (Espanha)
Comentário: Brigitte Degen, DG Employment Social Affairs and Equal Opportunities - Anti-Discrimination Unit (União Europeia)
Jesuína Ribeiro, Subdirectora-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular (Portugal)

16h15-16h30 Pausa para café

16h30-18h Painel 4 – bons olhos os vejam: Boas Práticas de Políticas Transversais
Moderação: Paulo Côrte-Real, Presidente da Direcção da Associação ILGA Portugal
Intervenções: Xavier Verdaguer i Ribes, Responsable - Programa per al col•lectiu de gais, lesbianes i transsexuals (Catalunha, Espanha)
Els Veenis, Senior Policy Advisor - LGBT Policy Affairs (Países Baixos)
Martha Franken, Senior Advisor – Coordinator, International Equal Opportunities Policies (Bélgica)
Comentário: Jorge Lacão*, Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (Portugal)

Dia 2 Sábado, 28 de Março de 2009

11h30-13h Painel 5 – corpo de delito: Identidade de Género e Discriminação
Moderação: João Pereira, Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género
Intervenções: Carla Moleiro, Professora de Psicologia Social – ISCTE; investigadora – Projecto TRANSformation (Portugal)
Baastian Franse, Assistente Social - Transvisie, centrum voor genderdiversiteit (Países Baixos)
Julia Ehrt, Co-Presidente – Transgender Europe
Comentário: Vasco Prazeres, Chefe de Divisão de Informação, Comunicação e Educação para a Saúde da Direcção-Geral da Saúde (Portugal)

13h-14h30 Almoço

14h30-16h30 Painel 6 – direito ao coração: Discriminação das Relações Familiares das Pessoas LGBT
Moderação: Maria José Magalhães, UMAR
Intervenções: Robert Wintemute, Professor of Human Rights Law, School of Law, King’s College London (Reino Unido)
Susan Golombok, Directora do Centre for Family Research, Cambridge University (Reino Unido)
Ignacio Solá, Subdirector General de Promoción, Normativa y Desarrollo Social de la Dirección General contra la Discriminación - Ministerio de la Igualdad (Espanha)
Miguel Vale de Almeida, Professor de Antropologia - ISCTE (Portugal)
Comentário: Elza Pais, Presidente da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (Portugal)

16h30-16h45 Pausa para café

16h45-18h30 Encerramento

Moderação: Fernanda Câncio, jornalista – Diário de Notícias (Portugal)
Intervenções: Representantes de todos os grupos parlamentares* (Portugal)

* a confirmar

Faça a sua pré-inscrição pelo e-mail
conferencia@ilga-portugal.pt

Entrada livre. Possibilidade de obter certificado de participação.

 

Mais informações e actualizações permanentes em
http://www.ilga-portugal.pt/conferencia2009/

Associação ILGA PORTUGAL
Email:
ilga-portugal@ilga.org
http://www.ilga-portugal.pt/
 


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